Voar era muito bom! Era divertido. Era libertador. Volta e meia, durante os sonhos, Mel se via voando, deslizando no ar, girando pelo céu. Às vezes, era um voo rasante em alguma pracinha; outras vezes, contornava um prédio alto no centro da cidade, ou passava voando por baixo de uma grande ponte, circulando os pilares que chegavam ao fundo do mar.
Invariavelmente, esses sonhos terminavam de forma abrupta, com Mel despencando no ar e caindo velozmente de volta em seu corpo. Acordava um pouco assustada e ofegante; os voos eram muito divertidos, mas essa queda final provocava um pouco de ansiedade e de medo. Não entendia bem o que acontecia, mas se entregava às aventuras; afinal, caro leitor, um dos maiores sonhos da pequena Mel sempre foi voar! Parecia impossível, mas agora ela conseguia fazer isso, ao menos nos sonhos!
Um problema, porém, afligia Mel: nessa época ela começou a confundir um pouco os sonhos com a realidade; ela não conseguia diferenciar bem onde começavam e onde terminavam a imaginação, a fantasia, os sonhos, as aventuras e a vida “real”. E ela não tinha com quem conversar sobre esses sonhos, pois seus amigos, seus coleguinhas da escola e sua família não levavam a sério o que ela relatava. Ela, então, às vezes começava a acreditar que era meio maluquinha, ou que tudo não passava de sonhos. Só que ela gostava tanto desses sonhos, que no fundo preferia acreditar que os sonhos eram reais, que aquilo tudo realmente acontecia, como se ela vivesse em mundos diferentes que coexistiam, como se ela alternasse a vida entre duas dimensões. Seria isso possível?! Seria isso real, ou apenas sua imaginação?!
Um dia, porém, ela encontrou no sofá da sala um livro muuuito pequeno, um livrinho de bolso, cuja capa apresentava uma silhueta humana permeada por raios nas cores do arco-íris. Sentiu-se imediatamente atraída pelo livrinho; porém, ao ler na capa o título “Chakras e projeção astral” sentiu um pouco de medo e soltou o livro no sofá (perdoe-me, leitor, as confusões da memória…não tenho certeza se o título era exatamente esse, mas era algo parecido. Por muitos anos pesquisei e tentei encontrar novamente esse livro e nunca mais consegui, então não tenho nem certeza se o livro era real, se foi uma alucinação de Mel, ou “sei lá o quê”).
Tomou coragem, e apesar de o título a deixar bastante desconfortável, pegou novamente o livrinho e saiu pelo apartamento perguntando a sua família quem era o dono. Mais uma surpresa: todos disseram que nunca tinham visto aquele livro! Uai, como esse livro foi parar no sofá de casa?! Quem o deixou ali? Se não pertencia a nenhum morador da casa, certamente teria sido esquecido por alguma visita, algum amigo da família…ou não?! Bom…bastante relutante, Mel guardou o livrinho no armário do seu quarto e levou alguns dias tomando coragem para lê-lo. Seria aquele livro apropriado para uma criança de 6 anos de idade?! O conteúdo do livro poderia de alguma forma ajudá-la a entender melhor seus sonhos?! Ou…poderia trazer algo assustador?!
E Mel abriu o livrinho. Viu um desenho de uma pessoa com 7 círculos coloridos distribuídos ao longo do corpo. Leu que esses círculos se chamavam chakras, eram os principais centros de energia espalhados pelo corpo e poderiam ser tratados com cromoterapia e outras técnicas alternativas. Mel achou aquilo tudo muito interessante, mas ao mesmo tempo um pouco assustador e bastante diferente da realidade que ela conhecia. Deveria continuar lendo o livrinho? Em pouco tempo concluiria a leitura…mas aquele conteúdo faria bem a ela? Conseguiria lidar com essas informações tão chocantes, assimilar tudo isso sem “entrar em parafuso”? Antes de encontrar o livro, ela já estava se sentindo confusa, misturando fantasia e realidade…como esse novo conteúdo tão diferente se encaixaria nesse contexto?
E…foi então que ela viu o desenho de uma pessoa voando! :D Sim! Sim, o livro traria explicações sobre os sonhos que ela tinha! O livrinho caiu do céu e veio bem a calhar! Parecia ouvir uma voz: “Vamos, Mel, leia o restante do livro! Não tenha medo!” E ela leu. E percebeu que no desenho daquela pessoa voando, a pessoa estava “dividida” em duas: uma “parte” da pessoa voava…e outra parte da pessoa ficava deitada dormindo! E havia no desenho um fio que saía da nuca da “parte” que voava e se ligava ao corpo da “parte” que dormia… Sentiu um frio na espinha…então, ao sair para voar, não era “ela inteira” que voava?! “Meia Mel” voava, enquanto a outra “meia Mel” dormia?! Mas que maluquice era essa?! Era sua alma, sua essência, uma parte espiritual dela que voava, que vivia todas aquelas aventuras, enquanto seu corpo ficava dormindo em casa?! Seria isso perigoso? Poderia morrer, ou as duas partes dela se separarem e ficarem perdidas por aí?!
Meio assustada, continuou lendo e viu que aquele fio se chamava “fio de prata” (ou algo parecido…isso foi na década de 1980, não vou me lembrar exatamente do que ela me contou!), e que ele não poderia se romper acidentalmente durante os voos; era “indestrutível”, e só se romperia no momento em que estivesse definido que aquela pessoa iria mesmo morrer. Ou seja, era a morte que causaria o rompimento desse fio, e não um rompimento acidental que causaria a morte fora de hora. Bom, melhor assim, rsrsrs! Mas mesmo assim, Mel achou isso tudo muito espantoso, assustador, curioso, e não sabia se estava preparada para lidar com isso…precisaria, ao menos, descobrir quem era o dono daquele livro, para poder ter alguém com quem conversar. Mas não fazia ideia de quem poderia ser.
Bem, caro leitor, um “spoiler”: ela procurou, durante muitos anos, identificar quem seria o dono do livro…mas nunca descobriu! Estamos no ano de 2024; isso ocorreu há quase 40 anos, e isso continuou um mistério para ela: quem era o dono do livro?! Quem o deixou ali, ou como ele foi parar ali?! Por que depois o livro sumiu, e para onde foi?! Alguém o pegou, jogou fora ou escondeu?! Ou será que foi tudo apenas imaginação dela, ou talvez ela tenha visto o livro durante um sonho, e confundiu sonho e realidade? Até hoje Mel não faz ideia…
…e as aventuras continuaram por muito tempo, como veremos nos próximos contos desta história! Até a próxima, caro leitor! :)