A presença de Ganesha

Certa vez, numa noite fria e seca, Sri Ganesha se materializou para um grupo de devotos que, há dias, oravam e clamavam por sua presença. Eles estavam famintos e desesperados, pois no vilarejo onde moravam lhes faltava o básico:  comida.

Um dos devotos mais fervorosos falou: “Que nos falte comida, mas nunca falte o alimento para a alma, a fé.” Nesse momento, Lord Ganesha se manifestou, acompanhado por um rastro de fagulhas douradas que iluminava todo o ambiente. A noite virou dia; havia muita luz, e um doce perfume de rosas e sândalo tomava conta do ar. Uma atmosfera espiritual luminosa envolveu o lugar. Era ele, Ganesha, materializado ali – o removedor de obstáculos, filho de Shiva, senhor das energias, e de Parvati, a Deusa mãe benevolente.

Os devotos, perplexos, prostraram-se aos pés da divindade e, num misto de euforia e choro, começaram a entoar cânticos e mantras em agradecimento pela presença divina. Ganesha então ordenou que todos parassem e se levantassem imediatamente. E começou a falar sobre a diferença entre fé (Shrada) e fanatismo. Suas palavras reverberaram por todo o vilarejo, e as pessoas da comunidade, pouco a pouco, foram chegando.

Sri Ganesha disse: “Vocês nada conhecem sobre fé. Estão orando cegamente há vários dias e não conseguiram enxergar minha presença o tempo todo, em todas as coisas. Estou nas crianças, nas mulheres, nos velhos, nos animais, nas plantas, nos insetos, no ar. Vejam, estou presente nesta mangueira carregada de frutos; no entanto, desta vez, eles estão na parte mais alta da árvore, e por causa dessa cegueira fervorosa, vocês não conseguiram me ver. Estou nos tubérculos enterrados a poucos centímetros deste solo – vocês os plantaram meses atrás e se esqueceram.

A palavra oração guarda um princípio espiritual profundo, o mais necessário diante dos desafios da vida: AÇÃO. Oração é movimento, não gritos nem sussurros; orar é mobilizar a maior força que existe dentro do ser: a fé. Fé sem ação é ilusão, fanatismo cego. A maior conquista do ser humano é conquistar a si mesmo; a maior luta do ser humano é contra si mesmo. No seu bloqueio está a sua cura. Palavras repetidas ao vento são apenas palavras. Ação é o ato nobre de materializar pensamentos; uma ação silenciosa vale muito mais do que uma oração repetida sem fé. Vocês são iniciados espirituais, conhecem diversos rituais e mantras secretos, mas se esqueceram do principal: ação.

Ação sem consciência se torna uma repetição vazia de determinado condicionamento. O primeiro instinto é a preservação da vida; quando surge a vida, surge o instinto de preservação, a ação de preservar. Na dança cósmica da consciência, a preservação nasce a partir do que já vive. É fundamental que nasça a consciência da eterna presença em tudo; sem isso, resta apenas uma fé vazia, uma fé barulhenta e cega que não enxerga o divino em todas as coisas.”

Nesse momento, Ganesha bateu firme com o pé direito no chão, e dos galhos altos caíram diversas mangas perfumadas; em seguida, bateu firme com o pé esquerdo, e da terra surgiram vários tubérculos. Uma grande festa se formou, e da mesma maneira luminosa com que surgiu, ele desapareceu num piscar de olhos, deixando no ar um límpido perfume de esperança, consciência e renovação.

 

 

Diego Roque – 05/11/2024

 

1 comentário em “A presença de Ganesha”

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