PERGUNTA: – O que acontecerá com as práticas mágicas populares, que nos indicais misturadas aos mais diversos sortilégios, tudo sendo entendido como umbanda pelos leigos? Não temos de ser eletivos, excluindo-as?
RAMATÍS: – Ocorre um conflito entre dois caminhos. Um é a integração dos cidadãos hodiernos à práxis, bem informados, o que redunda, senão na renúncia total às tradições que não se encaixam mais na sociedade, no mínimo na sua reinterpretação de acordo com valores da consciência coletiva.
O outro é a exclusão dos ritos populares, o que não contribui em nada e denota comportamento sectário. Há ainda os que preferem fazer ritos ditos “puros”, de preferência só com estudo e sem atender os reclames dos consulentes.
Exatamente por não ter codificação doutrinária que a engesse, a umbanda se mostra solução original: dedicada tecelã, movimenta os fios num liame de continuidade para as práticas mágicas populares, inserindo-as na dominância filo-religiosa negro-ameríndia, amalgamada com a prática cristã-espírita-mediúnica.
A umbanda é inclusiva, não sectária, sem proselitismo, tecelã de uma colcha viva do Pai Maior, que é toda luz e se faz com a costura de muitos retalhos, divina agulha que pacientemente alfineta as almas rumo ao amor, dando o tempo necessário a cada consciência para a unificação cósmica; daí a diversificação que cada vez mais se fará unidade. Assim, os sortilégios e os fetichismos serão amainados qual tenaz camelo que atravessa um deserto causticante. Refleti que a eleição do ser é de foro íntimo e deveis procurar agremiação que vos conduza a um estado psicológico condizente com vossos anseios espirituais.
Quando transferis para os outros valores e crenças internos, exteriorizando-os na forma de padrões de conduta que excluem, como faziam aos banidos hereges do pretérito, contrariais o amor que nada impõe, uma vez que orienta e esclarece sem estabelecer julgamentos, dando a cada consciência a oportunidade sublime de usar a razão, fundamentando a amorosidade que unifica, não a que separa a coletividade umbandista.
PERGUNTA: – Mas, se “os ‘caboclos’, ‘pretos velhos’ e ‘crianças’ são o canal de representatividade com os orixás, formando as sete linhas vibratórias da umbanda”, conforme vossos dizeres, concluiremos que os persas, etíopes, marroquinos, indianos, árabes, egípcios, indochineses, povos nômades do deserto (ciganos), entre outras formas de apresentação dos espíritos que caracterizam o agrupamento do Oriente, são entidades excluídas da umbanda, não fazendo parte dela?
RAMATÍS: – As entidades estruturais, que plasmam o triângulo fluídico mantenedor da umbanda, do Espaço para a Terra, são os caboclos, pretos velhos e crianças. Além deles, aglutinam-se “à volta” do movimento umbandista, fortalecendo a mensagem libertadora do Cristo Cósmico e as leis universais, equânimes para todos como o raio do Sol que não distingue telhado em dia inverna!, todas as formas que servem de veículo da consciência para os espíritos nas diversas latitudes siderais. Desde seu surgimento numa sessão de mesa, [1] quando foi verbalizado pela primeira vez o vocábulo “umbanda”, com toda a sua sonoridade mântrica associada ao mediunismo, seus mentores do Espaço foram insurgentes contra a exclusão, na época, dos negros e silvícolas, proibidos que eram pelos dirigentes encarnados de se manifestarem, além de não autorizarem a passividade dos médiuns para espíritos que se apresentassem como dessas raças, taxados por eles de inferiores e primitivos. Assim, suas bases são alicerces evolutivos que incluem, sem preconceitos raciais espiritistas, todas as etnias excluídas por outras religiões: negros, escravos, brancos, amarelos, nativos e imigrantes na pátria brasileira, descendentes de todos os povos do orbe terrícola.
[1] Após a reunião mediúnica na Federação Espírita do município de Niterói, quando foi anunciada a criação da umbanda, em sua primeira manifestação por intermédio de Zélio Fernandino de Moraes, o Caboclo das Sete Encruzilhadas, entre outras normas do culto nascente, ditou as seguintes diretrizes para a umbanda e para a fundação da Tenda Espírita Nossa Senhora da Piedade: “Assim como Maria acolhe em seus braços o Filho, a Tenda acolherá os que recorrerem a ela nas horas de aflição… Todas as entidades serão ouvidas, e nós aprenderemos com os espíritos que souberem mais e ensinaremos àqueles que souberem menos; a nenhum viraremos as costas nem diremos não, pois esta é a vontade do Pai”. Maiores detalhes em Umbanda e sua História, de Diamantino F. Trindade, 2ª edição, publicação da Editora Ícone, p. 62.
RAMATÍS – A MISSÃO DA UMBANDA