PERGUNTA: Insistimos, ainda, em indagar-vos: mesmo submetida às maiores privações do mundo, sobrevivendo dificilmente, sem qualquer ajuda, a mãe paupérrima é sempre culpada se praticar o aborto? Não lhe cabe nem o direito de decidir pela solução de abortar, ante a angústia de procriar um filho para a nudez e a fome?
RAMATÍS: Que seria do mundo, caso Maria de Nazaré resolvesse abortar o seu filho Jesus, só por causa de sua pobreza? Ela não sabia se teria o pão do dia seguinte. Quantos artistas sublimes da música, da pintura e da escultura, ou servidores da ciência humana, teriam deixado de existir, não trazendo aos sentidos humanos a beleza da cor, a harmonia dos acordes ou a estesia da forma, caso suas progenitoras indigentes os tivessem abortado pelo medo da miséria? Seja qual for a opinião do mundo, justa ou injusta, racional ou emocional, o certo é que, após se iniciar a gestação, e apesar das justificativas de problemas sociais, financeiros, econômicos, é sempre um agravo interromper o curso criativo. Ainda, supondo-se que o nascituro venha a se extinguir pelas forças agressivas e precárias do meio ambiente, a mãe cumpriu o seu dever e redimiu-se perante a Lei.
Conforme já vos dissemos, o aborto só é lícito em casos excepcionais, como quando periga a vida da gestante a ser salva pelo médico, embora com o sacrifício do feto. O destino de qualquer criatura é previamente traçado antes de sua encarnação e a “Administração Divina” jamais elabora programas absurdos, injustos ou impossíveis. Não cabe à mãe, ou aos demais, decidir se o aborto é mais salutar nos casos de dificuldades sociais, econômicas ou mesmo de estabilidade civil. O espírito que se materializa no ventre da mulher terrena, apesar de onerado por mil dificuldades, há de viver e cumprir o destino, que é o resultado específico da soma das virtudes e dos vícios perpetrados em suas encarnações anteriores. Mesmo o nascituro atirado numa lata de lixo jamais perecerá à míngua, caso seja do seu projeto sobreviver e emancipar-se no seio da maior pobreza do mundo. Não há qualquer imprudência, leviandade ou negligência por parte dos mentores siderais, quando decidem sobre determinado destino humano, considerado pelos homens justo ou injusto. Tudo é examinado, programado, de modo a favorecer o encarnante quanto à sua vida espiritual, pois, o resto é simples acessório de vivências carnais transitórias. Cada homem vive o esquema necessário ao seu carma passado, quer venha a nascer num tugúrio infecto ou num palácio dourado. Jamais receberá proventos e favorecimentos indevidos; nunca pagará dívidas e contas que não assumiu.
O ventre materno é, tão somente, a “câmara de materialização” do espírito encarnante, o qual mobiliza as energias etéreo-físicas do mundo e, ali, confecciona o traje carnal para frequentar a escola terrena. Todo aborto não justificado por uma razão importante é sempre violência e crime, frustrando um curso benfeitor. É insensata a mulher que resolve eliminar o fruto resultante do seu próprio prazer, só porque isso lhe traz incômodos, desprestígio social, críticas públicas ou vivência onerosa na existência física tão passageira.
Terminada a gestação e entregue o resultado à luz do mundo, a mãe ainda pode ser algo culpada, caso não cuide da sobrevivência daquele filho; mas, é bem menor o seu delito, quando não pratica o aborto, mesmo diante da dificuldade, porque da vida física do filho os fados se encarregam.
DO LIVRO: “SOB A LUZ DO ESPIRITISMO” RAMATÍS/HERCÍLIO MAES – EDITORA DO CONHECIMENTO.