(O Ensinamento de Krishna, o Senhor dos Olhos de Lótus)
Wagner Borges
Ainda era noite quando o meu coração ganhou asas…
E quando a aurora surgiu, o brilho era em meus olhos.
Então, eu escutei o som da flauta d’Ele.
E miríades de estrelas dançaram na minha frente.
E elas me disseram: “Venha, entre nas ondas do Samadhi!”
E eu fui, em Espírito e Verdade, para dentro da Luz…
E isso era dentro do meu olho espiritual.
E, ali, dentro de um turbilhão de cores vivas, Ele apareceu.
Sim, era Krishna, o Senhor dos Olhos de Lótus, o Mestre do Darma.
Rindo, Ele me disse: “O Samadhi não é uma técnica iogue, é expressão do Amor.
Pois, de que adianta elevar a Kundalini pela coluna, se o coração não despertar?
Sem Amor, o iogue fica estéril espiritualmente, e a arrogância o possui…
Sem a Luz guiando-o em sua sadhana, os seus esforços são filhos de Maya.
Sem a rendição do seu ego, sua senda torna-se perigosa e inflamada de empáfia.
Sem o fogo de viveka, as palhas de suas tolices jamais serão queimadas.
Sem flexibilidade em seus sentimentos, os seus chacras serão opacos.
Sem aspirações superiores, o seu pranayama será só ação mecânica e sem viço.
Yoga é união! Samadhi é Amor. E a Kundalini é a música celeste nos nádis.
Dhyana é transbordamento de serenidade abraçando secretamente o mundo.
Yoga é ação correta nos três mundos – é harmonia das três gunas…
Prathyahara não significa isolar-se do mundo, é somente ir para dentro do Ser…
Para descobrir o Eterno em seu próprio coração – para ver o brilho de Prakash.
Dharana não é só o treinamento do foco mental, mas a educação do pensamento.
Se o iogue não perdoa, suas kryias de nada adiantam, pois há sujeira em seu peito.
Se há dureza em seu campo emocional, os espíritos inferiores já o dominaram.
Narananda, continue projetando as setas do discernimento na senda espiritual…
E nunca se esqueça que todos os seres são irmãos! E que Samadhi é Amor.”
Sim, Ele me disse isso, enquanto eu mergulhava na Luz Pura de Ananda.
E eu vi camadas de estrelas desdobrando-se à minha frente, na festa da Vida.
E escutei aos Gandharvas realizando a canção das esferas espirituais…
E, para onde eu olhava, eu só via o Olhar de Krishna em meio às estrelas.
E, dentro de mim, reverberava a risada d’Ele em ondas de sukha.
Ele, o Senhor dos Olhos de Lótus, que me ensinou que Samadhi é Amor em ação.
P.S.:
Ah, o meu coração ganhou asas…
Ainda era noite, mas Ele veio me despertar.
E raiou a aurora do Samadhi.
E eu me derreti no fogo de viveka de Krishna.
Sim, quando se escuta o som de Sua Flauta, tudo muda.
E o Amor faz a União acontecer.
Então, o mantra do iogue é um só: “Gratidão!”
(Dedicado a Paramahamsa Ramakrishna, Sry Aurobindo, Ramana Maharishi, Swami Sivananda, Radha, Mataji, Babaji, Lahiri Mahasaya, Sry Yuketswar, Paramahamsa Yogananda, Sry Hariharananda – e também aos rishis que inspiraram os ensinamentos dos Upanishads).
Paz e Luz.
Gratidão.
Wagner Borges – mestre de nada e discípulo de coisa alguma.
São Paulo, 17 de dezembro de 2013.
– Notas:
Para facilitar a compreensão das expressões oriundas do sânscrito, deixo um pequeno glossário na sequência.
– Samadhi: estado de consciência cósmica; expansão da consciência.
– Yoga (Ioga): união.
– Darma (Dharma): dever, missão, programação existencial, mérito, bênção, ação virtuosa, meta elevada, conduta sadia, atitude correta, motivação para o que for positivo e de acordo com o bem comum.
– Sadhana: disciplina iogue; disciplina espiritual.
– Viveka: discernimento espiritual.
– Pranayama: práticas iogues respiratórias e bioenergéticas.
– Prathyahara: interiorização (e remoção da influência sensorial).
– Dharana: concentração.
– Dhyana – meditacão.
– Kryias: ações de purificação; práticas iogues de limpeza e purificação.
– Ananda: bem-aventurança; êxtase espiritual.
– Narananda: o homem portador da bem-aventurança celeste entre os homens; esse era um dos nomes de Arjuna, principal discípulo de Krishna. Por extensão, significa um trabalhador espiritual ligado às vibracões de Krishna.
– Gandharvas: cantores celestes; devas (divindades) da música; nos Vedas, essas divindades revelam aos mortais os arcanos espirituais do Céu e da Terra.
– Sukha: estado de contentamento espiritual.
– Prana: sopro vital; força vital; energia.
– Rishis: sábios espirituais; mestres da velha Índia; mentores dos Upanishads.
– Nádis: condutos sutis por onde circulam as energias.
– Maya: ilusão; tudo aquilo que é mutável, que está sujeito à transformação por diferenciação.
– Prakash: luz espiritual; luz do eterno.
– Gunas: a energia manifestada nos planos fenomênicos se apresenta como três gunas (qualidades), na natureza:
* Rajas – atividade, movimento, paixões. Tudo o que se refere a rajas é considerado rajásico. Exemplos: agitação, raiva, ansiedade, fundamentalismos e exageros de qualquer espécie.
* Tamas – inércia. Tudo o que se refere a tamas é considerado tamásico. Exemplos: falta de motivação, medo, ignorância e bloqueios de qualquer espécie.
* Sattva – equilíbrio, pureza. Tudo o que se refere a sattva é considerado sattvico. Exemplos: paz interior, equilíbrio emocional e energético, sentimentos elevados, lucidez, discernimento e manifestações equilibradas.
– Mantra: palavra oriunda de manas: mente; e tra: controle; liberação – Literalmente, significa “Controle ou liberação da mente”.
Determinadas palavras evocam uma atmosfera superior que facilita a concentração da mente e a entrada em estados alterados de consciência. Os mantras são palavras dotadas de particular vibração espiritual, sintonizadas com padrões vibracionais elevados. São análogos às palavras-senhas iniciáticas que ligam os iniciados aos planos superiores. Pode-se dizer que os mantras são as palavras de poder evocativas de energias superiores. Como as palavras são apenas a exteriorização dos pensamentos revestidos de ondas sonoras, pode-se dizer também que os mantras são expressões da própria mente sintonizada em outros planos de manifestação.
– Chacras: são os centros de força situados no corpo energético e têm como função principal a absorção de energia – prana, chi -, do meio ambiente para o interior do campo energético e do corpo físico. Além disso, servem de ponte energética entre o corpo espiritual e o corpo físico.
Os principais chacras são sete – que estão conectados com as sete glândulas que compõem o sistema endócrino: coronário, frontal, laríngeo, cardíaco, umbilical, sexual e básico.
– Kundalini: significa literalmente “enroscada”. Esse nome deve-se ao seu movimento ondulatório que lembra o movimento de uma serpente. Daí a expressão esotérica “fogo serpentino”. Ela também é chamada pelos iogues de “Shakti”, a força divina aninhada na base da coluna.
Kundalini nada tem a ver com o sexo diretamente, muito embora seja a energia que ativa e vitaliza a sexualidade. Devido à prática de exercícios tântricos que envolvem a contenção do orgasmo, quando esse conhecimento chegou ao Ocidente foi logo desvirtuado. Hoje, esse tema surge associado a rituais e posturas sexuais aqui no Ocidente. No entanto, o despertar da kundalini é um processo puramente espiritual e energético em essência. Envolve a ativação dos chacras, principalmente do chacra cardíaco, que equilibra e distribui corretamente o fluxo ascendente da shakti ao longo dos nádis. Não significa acender um foguete esotérico no traseiro e decolar pelos nádis ao longo da coluna, como muita gente imagina. “Acender” não significa necessariamente “ascender”.
O estudo da Kundalini envolve o conhecimento aprofundado dos chacras, dos nádis que correm ao longo da coluna – ida, pingala e sushumna -, e das glândulas endócrinas, bem como um conhecimento básico dos yantras e bijas-mantras específicos para sua ativação.
Sugiro ao leitor interessado no tema que adquira o ótimo livro “Teoria dos Chacras” – Editora Pensamento -, do pesquisador japonês Hiroshi Motoyama.
Obs.: Deixo na sequência três texto antigos, com alma oriental, que acrescentarão muito a esses escritos de hoje.